sexta-feira, 6 de maio de 2016

Carta de Karl Barth a Francis Schaeffer

    



    Tanto Francis Schaeffer quanto Cornelius Van Til e Oliver Buswell acusaram Karl Barth de ser um teólogo muito perigoso e que nega pilares da fé cristã. Entretanto, os três queriam, insistentemente, conversar com Barth e iam à sua procura. Van Til (que escreveu um livro detratando Barth chamado Cristianismo e Barthianismo), inclusive, quando Barth deu várias palestras nos Estados Unidos, queria, a todo custo, encontrar-se com Barth. Este, por sua vez, não queria receber Van Til devido ser muito atacado por ele e seus colegas de sua vertente teológica. 

    Abaixo, traduzi uma carta que Barth enviou a Schaeffer (que viveu muito tempo na Suíça de Barth) e que Barth, nesta mesma carta, tem como objetivo responder Buswell também. Texto traduzido deste site,

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    Bergli, Oberrieden, 3 de setembro de 1950

    Reverendo Francis Schaeffer

    Châlet des Frênes

    Champéry

    Estimado sr. Schaeffer!

    Reconheço haver recebido sua carta de 28 de agosto e seu texto "O Novo Modernismo". No mesmo dia seu amigo J. Oliver Buswell escreveu-me de Nova Iorque junto com uma crítica, "A Teologia de Karl Barth". Vejo que as coisas que você pensa sobre mim são, aproximadamente, do mesmo tipo daqueles que encontrei no livro de [Cornelius] Van Til sobre esse mesmo tema¹. E vejo que você e seus amigos escolheram cultivar um tipo de teologia, a qual consiste em um tipo de criminologia; você está vivendo do repúdio e da discriminação de todo tipo e de toda criatura semelhante, cujas concepções não são inteiramente (ou numericamente) idênticas com suas perspectivas e declarações. Você está "caminhando sobre a rocha sólida da verdade [assim como você diz de si mesmo]. Nós, pobres pecadores, não estamos fazendo como você. Eu não estou. Meu caso foi sinalizado como sem esperança alguma. O júri falou, o veredito foi proclamado, o acusado foi pendurado pelo pescoço até que morreu nesta mesma manhã.

    Bom, bom... Digamos à sua maneira: é assunto seu, e ao fazer as coisas, ao falar, e ao escrever como o faz, você deveria arcar com suas próprias responsabilidades. Você pode repudiar meu trabalho e minha obra "como um todo". Pode me chamar de nomes como mentiroso, vago, anti-histórico, desinteressado com a verdade, entre outros. Pode continuar fazendo seu trabalho de "detetive" nos Estados Unidos, na Holanda, na Finlândia e em todo lugar. Pode me desacreditar como o mais perigoso herege. Por que não? Talvez o Senhor disse-lhe que você fizesse isso.

     Porém, por que você, e para qual propósito, deseja uma conversa mais profunda comigo? O herege foi queimado e enterrado para o bem de todos. Por que você quer perder mais tempo (e o dele²) falando com ele? Estimado sr. Schaeffer, você disse que percebe que vocês estão mais perto dos antigos modernistas e do católicos romanos do que de mim e de homens como eu. Porém, por que você não prova a eficácia de sua "apologética" em alguns exercícios com estes "antigos modernistas" e com católicos romanos, que você encontrará aos montes aqui na Suíça? Por que segue perturbando este homem em Basileia, a quem derrotaram tão esplêndida e completamente?³

    Regozije-se, senhor Schaeffer (e chamem-se, vocês mesmos, os "fundamentalistas" de todo o mundo). Regozije-se e siga crendo em sua "lógica" (como no quarto artigo de seu credo) e em vocês mesmos como os únicos verdadeiros "crentes bíblicos". Grite tanto quanto puder! Porém ore, e permita-me deixá-lo em paz. As "conversas" são possíveis com pessoas de "mente aberta". Seu texto e as críticas de seu amigo Buswell revelam o feito de sua decisão de fechar as portas. Não sei como lidar com um homem que vem me ver e falar comigo na qualidade de detetive/inspetor ou com o comportamento de um missionário que vai converter um pagão. Não, obrigado!

    Seu, sinceramente.

    Desculpe meu mau inglês. Não estou acostumado a escrever em seu idioma.

    Estou enviando uma cópia desta carta ao reverendo Buswell.

    Estimado sr. Buswell!

    Li suas criticas junto com os escritos do sr. Schaeffer. Todo o conteúdo de minha carta se refere a você também. 

    Seu,

    Karl Barth 

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Notas

¹ Livro de Van Til chamado Cristianismo e Barthianismo 
² Barth fala de si mesmo na terceira pessoa
³ Novamente Barth fala de si na terceira pessoa

Tradução: Marlon Marques

2 comentários:

blogpraloizio disse...

Já neste período esses ícones de um fundamentalismo norte americano tinham um comportamento semelhante a visão geopolítica do Estados Unidos de avocar pra si o status de polícia do mundo.

Marcelinho disse...

Só tem um problema, Pr. Aloizio, o Francis Schaeffer apesar de americano vivia na Suíça e se afastou bastante do fundamentalismo durante e vida, já o senhor Cornelius Van Til não era americano, mas sim dos Países Baixos. Essa ideia de que o fundamentalismo é meramente americano não faz o menor sentido, o fundamentalismo batista americano é sim um fator próprio da cultura americana, mas a interpretação literal da bíblia é algo que já vem de muitos e muitos séculos atrás, pode ser verificado já dentro dos judeus, principalmente dos essênios, aliás os essênios foram os que mais se achegaram à Jesus, sendo João Batista um dos líderes desta seita judaica.