Alguns cristãos têm acreditado
que a esfera do Reino de Deus e a esfera do governo civil, embora igualmente
válidas e necessárias, são mutuamente excludentes. Assim, nenhum indivíduo pode atuar consistentemente
em ambas ao mesmo tempo. Pacifistas que consideram que o Estado desempenha uma
função necessária veem-no, ainda, como algo mau ou que necessariamente se
utiliza de meios maus para atingir seus fins. Desse modo, quando uma pessoa se
torna cristã, pode entrar no Reino de Deus somente se separando do Estado. Cabe-lhe
escolher obedecer a um ou ao outro; não pode obedecer a ambos. Isto se aplica
especialmente à questão da participação na guerra, a qual é quase sempre feita
em nome do governo civil. Se uma pessoa é cristã, não pode agir em nome do
Estado; logo, não pode se engajar na guerra sob quaisquer circunstâncias. Assim
dizem muitos cristãos.
Por outro
lado, a maioria dos cristãos, entre os quais me incluo, têm crido que, embora a
Igreja e o Estado sejam distintos e desempenhem diferentes papéis, eles não
conflitam um com o outro, mas se complementam. Os padrões de conduta que se
aplicam aos indivíduos, por um lado, e ao Estado, por outro, são distintos e
diferentes, mas não são contraditórios e excludentes. Nenhum é
superior ou mais nobre do que o outro. Não se aplica um a cristãos e o outro a
não cristãos; ambos se aplicam a todas as pessoas.
Quando cumpre o propósito para o qual
Deus lhe ordenou, o governo civil não é mau, nem exerce uma função má. É servo
de Deus (Rm 13.1-4); seus objetivos e deveres são designados por Deus. São
corretos. E se as funções estatais, inclusive a guerra defensiva, são CORRETAS
(e elas são), então são CORRETAS para os cristãos. As normas divinas se aplicam
a todos igualmente. As regras de Deus para conduta pessoal (p. ex., o Sermão da
Montanha) destinam-se a incidir, do mesmo modo, a todas as pessoas. Não
constituem uma norma restrita aos cristãos somente (ainda que os cristãos sejam
os únicos que as respeitem realmente). As normas para as atividades civis
oficiais também se aplicam, igualmente, a todas as pessoas, crentes e
descrentes sem distinção. Tudo quanto é correto para não crentes no exercício
do serviço público é correto para os cristãos também.
Um cristão pode, pois, tomar parte em
qualquer atribuição legítima do Estado, até mesmo da guerra, se defensiva. Não
se trata de violação ao ensino de Cristo a respeito de conduta pessoal (isso
significa que os cristãos também podem ser agentes de polícia).
A conclusão é que os cristãos podem e
devem responder ao “chamado às armas” para participação em uma “guerra justa”.
Já que aos cristãos se ordena submissão à autoridade civil, é errado recusar o
alistamento ou a convocação militar, caso necessária. Seguindo os princípios
bíblicos para a desobediência civil, no entanto, um cristão deve desobedecer a
autoridade civil, se requisitado a fazer algo errado. O cristão deve julgar as
atividades de seu governo. Se este lhe ordena a participar daquilo que entende
ser uma guerra injusta, em boa consciência ele deve declinar (e aceitar as
consequências). Isso é denominado objeção de consciência seletiva. É a única
posição consistente com a noção de “guerra justa” (Infelizmente, o governo dos
Estados Unidos não reconhece a validade dessa posição*).
Embora o pacifismo, por si só, não seja
uma posição bíblica, a consciência de um pacifista – ainda que equivocada –
deve ser respeitada.
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Tradução: Wesiley Monteiro
* Nota do tradutor: no Brasil, a Lei
8.239/1991 regulamenta a prestação de serviço alternativo ao serviço militar
obrigatório prevista na Constituição Federal de 1988, que assim dispõe: - “Art. 5º, VIII: ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa,
fixada em lei”; - “Art. 143: O serviço militar é obrigatório nos termos
da lei. § 1º Às Forças Armadas compete, na forma da lei,
atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem
imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença
religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades
de caráter essencialmente militar. § 2º - As mulheres e
os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo de paz,
sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir”.
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